Fibras da Amazônia: cultura que nasce nas várzeas e que não agride o meio ambiente

Por Náferson Cruz | Amazônia 360º      ____  imagens: Ricardo Oliveira

São mais de quatro décadas dedicadas ao cultivo e colheita de juta e malva na Amazônia. Hoje, com 53 anos de idade, Arimar Ramires de Lima, conta que no passado, ele chegou a ensaiar outra profissão para auxiliar no sustento da família, mas foi às margens do Paraná do Periquito, na comunidade de São Lázaro, a duas horas distante do município de Manacapuru (a 84 quilômetros de Manaus), num motor 90HP, que Arimar plantou seu seu berço no cultivo da juta e malva, principal matéria-prima que embala sacos de café e batata e, outros, que desembocam em mercados do mundo afora.

O sábio caboclo aprendeu o léxico amazônico ainda criança, quando tinha 12 anos, uma herança deixada pelos pais, já falecidos. Desde lá, não largou mais seu fiel escudeiro: o terçado, que com ele segue uma rotina ao ritmo das águas. Após o período de subida dos rios, começa a semeadura das lavouras nas áreas de várzeas, que afloram à beira do rio à medida de as águas baixam. “Seu Arimar”, como é conhecido pelos beiradões, costuma lançar sementes de juta e malva às margens do rio início do primeiro semestre.

Além de ficar horas dentro da água, o produtor ainda tem que lidar com os perigos da região, como jacarés, cobras e arraias

 

Dessa terra molhada, longos talos de 20 milímetros de espessura se erguem até quatro metros de altura. Para ter um bom ritmo dessa produção, Arimar se reveza com seus sete filhos, que desde cedo aprenderam a lhe dar com o cultivo de fibras. Eles aplicam golpes precisos nos caules. A tarefa árdua continua nos meses que se seguem, pois o processo de colheita não admite interrupções. Ou seja: sol forte sol amazônico ou chuva há homens na lida. O descanso chega quando a noite está prestes a cair e, é neste momento, que Arimar toma ciência da produção alcançada ao longo do dia.

No dia seguinte, a família Lima levanta cedo, são 5h, para o contínuo processo na lavoura. Dessa vez, o corte ficou para trás. Agora, há de se mergulhar no rio, onde passam mais de oito horas para a minuciosa imersão das hastes na água para separar o caule da fibra, processo chamado de “afogamento”. É nesse procedimento – de afogamento – que a atividade requer bastante habilidade, força e artimanha. Além de ficar por 4 horas dentro d’água, o produtor ainda tem que lidar com os perigos da região, como jacarés, cobras e arraias.

Juticultores durante o processo de imersão (afogamento) das hastes às margens do rio Solimões

Confinamento

Cunhado de Arimar, Raimundo Sabino Nobre, 38 anos, o “Zeca”, também atua no cultivo da  juta e malva. Enquanto mergulhava as hastes no rio, ao mesmo tempo fazia cálculos sobre a dimensão da área cultivada. “As lavouras são limitadas por quatro quadras (áreas de 100 metros quadrados), que chegam a percorrer até dois quilômetros de terra cultivada às margens do rio”, disse Zeca ressaltando que sua área corresponde a algo próximo de cinco hectares.

Após o confinamento na água, a fibra é retirada e separada em maço, chamado de “boneca”, para o processo de descorticarem (técnica manual utilizada para extrair a fibra da parte lenhosa ou casca da planta). Molhada, a boneca de fibra chaga a pesar 10 quilos, quando seca não passa de um quilo. Posteriormente, esses maços de fibra são retirados em canoas e, logo depois são estendidos nos varais (traves), para exposição ao sol. A partir daí a fibra ganha, novamente, o formato de boneca, para depois ser usada como matéria-prima, sobretudo para a confecção de sacaria para acondicionar café e batata.

Após o cultivo e a colheita, maços de fibras são estendidas nos varais ou traves, como costumam chamar os juticultores

Do produtor às cooperativas

Após incansáveis meses retirando a produção, ou melhor, o sustento às margens do rio, cena semelhante a de vietnamitas à espreita de soldados norteamericanos durante a Guerra do Vietnã (1959 a 1975), a fibra, cuja venda é assegurada por meio da Cooperativa Mista Agropecuária de Manacapuru (Coomapem), é levada por embarcações arrendadas pelo grupo cooperativista, para dar o suporte e coleta das produções junto às comunidades. Já no armazém da cooperativa, o produto é classificado e armazenado.

Segundo a dirigente da Coomapem, Eliana Medeiro do Carmo, os produtores já chegaram a produzir quase duas mil toneladas de matéria-prima, geradas pela associação, produção esta que foi comercializada nos mercados de Minas Gerais, São Paulo, Espirito Santo e Roraima. Nessas regiões, o café embalado nas sacas de juta e malva leva o nome do Brasil para o Oriente Médio e Ásia. Enquanto isso, Seu Arimar e a família seguem semeando a terra.

Famílias unidas pela fibra

Mãos calejadas pelas intensas lidas, pele rachada pelo mormaço amazônico e o denso olhar esmiuçam não apenas a jornada do juticultor Arimar Ramires, mas também a de muitos outros audazes ribeirinhos, que fazem do cultivo da juta/malva a principal atividade econômica para a subsistência. O juticultor realça que para atuar no ramo, a força de vontade, a perseverança e o amor aquilo faz são imprescindíveis.

O juticultor Arimar Ramires (à direita), conta com ajuda dos filhos para se manter no ramo

 

Ele lembra que, a partir de 1975, o setor passou por um período conturbado, e ele até chegou a pensar em desistir da atividade para e trabalhar na sede do município. “Além do intenso trabalho, tínhamos que vender o produto a baixo custo aos “patrões” na cidade, quando não oferecíamos o produto aos donos dos ‘regatões’. Foi um período bastante difícil”.

Com o retorno da tradicional cultura extrativista, apoiado pelos setores público e privado nos últimos nove anos, Arimar, conseguiu driblar as dificuldades. O juticultor foi um dos beneficiados pela distribuição de sementes para o plantio de juta e malva, feita pelo Governo do Amazonas. Mais de 15 mil famílias foram beneficiadas no Estado. Para Arimar Ramires, o cultivo se tornou significativo, e, com a crescente demanda, o juticultor conseguiu investir na educação dos filhos e num imóvel em Manacapuru. Na última safra, Arimar conta que conseguiu negociar 18 toneladas de fibra, sendo 80% de sua produção e o restante comprado diretamente dos “meireiros” – que atuam apenas no corte.

Raimundo “Zeca” também dispõe da ajuda de dois dos quatro filhos. Segundo ele, a renda desta safra iria custear os estudos dos filhos e a alimentação da família. O caçula, José Carlos, 14, ajuda o pai nas horas vagas. Ele conta que cursa o ensino tecnológico do programa de Educação à Distância (EaD), na Escola da Comunidade São Lázaro. Após a conversar com a reportagem, pai e filho começaram a árdua tarefa de colocar para dentro da canoa 500 feixes ensopados pela água, cada um pesando 10 quilos.


A juta
Os produtores explicam que o cultivo da juta exige um clima quente e úmido, e em solo bem drenado típico da região amazônica. A fibra chegou ao Estado trazida do continente asiático por imigrantes japoneses, por volta de 1920. Uma variedade adaptada às condições da região amazônica veio apenas a partir de 1935, introduzida pelo colono Ryoto Oyama.
A malva
Já a malva é uma fibra de maior resistência, porém, menos brilhosa e sedosa. Sua produção no estado do Amazonas tem se caracterizado devido à alta capacidade de fixação em terras de várzeas, proporcionando desta forma um solo extremamente fértil para sua produção.

Histórias de muitas ‘Marias’

Na Comunidade Paraná do Embuá, distante a 60 minutos de Manacapuru, numa voadeira motor 90HP, a produtora rural Rosamira Ferreira Batista, 50, que reside em um flutuante, divide o cultivo de 3 quadras do plantio de juta e malva com o marido e dois filhos. Ela conta que está no ramo há 30 anos e que, a partir de 2002, a atividade começou a render lucro.

Próximo às margens das águas do Embuá, Maria Francisca Ferreira Frota, 46, vestida como se fosse num canavial, cortava as hastes enquanto as filhas, duas crianças, brincavam entre as plantas.

Desde cedo, Maria Francisca, ensina às duas filhas os caminhos das fibras, cultiva pela família há 30 anos

 

Maria, assim como muitas outras “marias” que atuam nesta cultura, disse que toda a família está empenhada no ramo há mais de 30 anos. “Atuamos de forma distinta, unidos no coração, mas separados por uma boa produção”, disse a produtora em relação ao marido e os irmãos, que, naquele momento, estavam do outro lado do rio, exercendo a mesma atividade. “Apenas aplico os cortes e separo os feixes, após três dias eles vêm aqui e dão continuidade ao processo”, explicou Maria Francisca Frota.

Da lagosta à produção de juta e malva

Após anos desenvolvendo a atividade de pesca de lagosta na cidade de Icapuí, no Ceará, na divisa com o estado do Rio Grande do Norte, Mário César Rodrigues, 41, resolveu se fixar no Amazonas. Ele havia estado algumas vezes em Manaus para acompanhar o tratamento de saúde da mãe. Não diferente de muitos nordestinos, que acabaram ficando por aqui, Rodrigues resolveu abrir um estabelecimento comercial, um flutuante ancorado às margens do rio Solimões, na Comunidade do Canaboca 3, a uma hora e meia de Manacapuru.

Além de comercializar especiarias de modo em geral, a mulher do comerciante, Ana Cristina Rodrigues, 35, disse que o comércio se tonou, nos últimos seis anos, um dos principais pontos para a compra de fibra. Na última safra, a família Rodrigues chegou a negociar 20 toneladas de fibra. Durante a visita ao flutuante, que também funciona como residência dos Rodrigues, pouco mais de 500 quilos de fibra estavam estocados no local. A pequena quantidade, segundo Ana Cristina, que vai se juntar a 24,5 toneladas, meta de compra da família para este ano. Antes de a equipe de reportagem deixar o local, a comerciante disse que sentia saudade do Ceará, mas que prefere ficar pelas margens do rio Solimões.

A força cooperativista

Trabalhadores na linha de produção de juta e malva em fábrica no município de Manacapuru

 

Segundo a presidente da Cooperativa Mista Agropecuária de Manacapuru (Coomapem), Eliana Medeiro do Carmo, além de trabalhar com a produção de fibra prensada (juta/malva e orgânica), a usina atua em outras atividades vinculadas aos programas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), na área de frutas e pescado.

A cooperativa também dispõe do apoio da Agência de Desenvolvimento Sustentável (ADS) por meio do Programa de Regionalização de Merenda Escolar (Preme) e da parceria do Serviço Nacional do Aprendizado ao Cooperativismo no Estado do Amazonas (Sescoop/Am), na formação de jovens lideranças cooperativistas.

Eliana Medeiro ressalta o objetivo de trabalhar pela melhoria das condições de vida dos produtores de juta e malva dos pequenos produtores.

Atualmente, a Coomapem conta com um quadro cooperativista de 250 associados, distribuídos nos município de Manacapuru, Careiro, Iranduba, Manaquiri, Caapiranga, Anamã, Beruri e Coari. 

Cultura que não agride o meio ambiente

Com o crescimento da produção e exportação de café, que exige igual evolução na fabricação de sacaria, a juta e a malva têm sido valorizadas por conta da sustentabilidade de sua cadeia produtiva.

Todo o processo produtivo da matéria-prima nas comunidades ribeirinhas da Amazônia é feito de forma manual e sem a utilização de máquinas e fertilizantes. “O produto biodegradável é obtido sem insumo químico e sem sequer derrubar uma árvore, sendo, portanto, uma alternativa ecológica para a confecção de embalagens e sacolas”, destaca a presidente da Coomapem, Eliana Medeiro, ressaltando que, além de  ser sustentável, a cultura da juta se renova a cada ano, tornando desnecessárias as queimadas e o desmatamento.

Para consolidar a visão socioeconômica sustentável, a dirigente da Coomapem conta que o grupo cooperativista buscou apoio para que os índices na produção sustentável fossem obtidos. Hoje, a Coomapem conta com a parceria da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), através da Empresa Certificadora Ecocert e da Agência de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Amazonas (ADS).

Além de  ser sustentável, a cultura da juta se renova a cada ano, tornando desnecessárias as queimadas e o desmatamento

 

Eliana Medeiro destaca que a Ecocert atestou a qualidade do produto e certificou a Coomapem como a primeira Cooperativa de fibras de juta/malva a adquirir essa certificação de Produto Orgânico em Fibras Naturais , livre de agrotóxico e outros males que poluem o meio-ambiente.

A produção, o processamento, a rotulagem e a comercialização dos produtos orgânicos no Brasil são regidos pela Lei 10.831/03 e seus anexos, em fase final de regulamentação.

A dirigente explica que a Lei 10831/03 abrange os produtos agrícolas não transformados, os produtos de origem animal e os alimentos transformados. A mesma lei define, igualmente, as exigências mínimas requeridas para inspeção à qual cada produtor, processador ou cada comerciante de produtos orgânicos deve submeter-se e com as quais deve assumir compromisso. “A Coomapem fica responsável pela emissão dos documentos de garantia da qualidade orgânica dos produtos, válidos para o mercado”, completa Eliana Medeiro.

Produto sustentável e livre de hidrocarbonetos

A Companhia Têxtil de Castanhal (CTC), localizada no Pará, que recebe a fibra classificada da filial de Manacapuru, produz sacaria de juta livre de hidrocarbonetos para embalar produtos como café (exportação e mercado interno), batata, cacau, castanha, amendoim, algodão, tanino e minério de ferro, dentre outros. Essa produção da Castanhal é certificada pela BCS, uma certificadora independente de produtos ecológicos com sede na Alemanha. O selo BCS – reconhecido por toda Europa, EUA e Japão – garante que os produtos de juta da Castanhal sejam compatíveis com os preceitos da agricultura orgânica.

A empresa tem em seu DNA a preocupação com a sustentabilidade, iniciando pelo cultivo da juta que é uma cultura totalmente integrada ao bioma amazônico, pois é plantada nas calhas dos rios sem provocar queimadas ou desmatamentos. Também não são utilizados agrotóxicos, herbicidas ou fungicidas. A adubação é naturalmente feita pelo húmus deixado pelas cheias dos rios amazônicos.

A sobra que vale ouro 

Da juta e malva nada é descartado, até a sobra da matéria-prima (cardabo – excesso de fios) é destinado a construção civil

 

Durante o processo de transformação da sacaria, em que a fibra passa pela “estendedeira” e a “carda grossa” (máquinas que deixam a fibra mais fina), um excesso de fios chamado de “cardabo” é coletado e depositado em um espaço da fábrica. Quem pensa que a matéria-prima, que mais parece uma sobra, seria descartada, se engana. Esse material é muito utilizado em aplicações de gesso na construção civil.

A industrialização e mercado

De toda juta produzida, 50% dos fios viram sacos de café, 27% sacos de batata, 6% se dividem em sacos menores

 

Após o trabalho manual nas várzeas, a fibra extraída da juta e malva segue para a unidade da CTC de Manacapuru, que faz a classificação da matéria-prima e, posteriormente, repassa para a indústria, que faz a produção de fios, sacos e telas, localizada em Castanhal, no Pará.

Uma média de 10 mil sacos são produzidos por dia. Para chegar a este total, a fibra passa por inúmeras máquinas que amaciam, penteiam e distribuem os fios em copos, até ficar na forma de bobina. Depois, os fios são engomados para seguir a tecelagem, corte e finalizar na costura.

Após a embalagem dos sacos na fábrica da CTC, a carga segue com destino à região Sudeste do país. De acordo com o indicativo de produtores e cooperativas, a safra 2019/2020 da juta foi de 1,5 mil toneladas de malva e 1,2 mil toneladas de juta. De toda juta produzida, 50% dos fios viram sacos de café, 27% sacos de batata, 6% se dividem em sacos menores e o restante é utilizado no setor da construção civil, decoração e artesanato.

No auge da produção de juta no Amazonas, o Estado chegou a produzir 90 mil toneladas ao ano, segundo dados da Produção Agrícola Municipal de 2010, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Apesar de ter atingido R$ 572 milhões no ano passado, a participação amazonense corresponde a apenas 0,37% da produção nacional.

A juta (97%), a malva (87%) e o guaraná (19%) são os produtos agrícolas amazonenses que mais se destacam na produção nacional. Somados, o resultado é 7,6% melhor em relação a 2009 – e pouco abaixo da média nacional de 8,9%.

Após o trabalho manual nas várzeas, a fibra extraída da juta e malva ingressa no processo de industrialização

Subvenção econômica

Para desarticular indicadores desfavoráveis e reduzir as importações brasileiras do produto da Índia, que vem assolando o mercado de fibra no Brasil, cooperativistas e produtores de Manacapuru, principal produtor de fibra do país, o Governo do Amazonas, estabeleceu à subvenção econômica de R$ 0,50 concedida como incentivo aos produtores pelo quilo da juta e malva embonecada, reajustado pelo Decreto nº 41.830/2020.

O gestor da Secretaria de Estado de Produção Rural (Sepror), Petrucio Magalhães, destacou que, nos últimos cinco anos, a cadeia produtiva das fibras vegetais comercializou cerca de R$ 65 milhões que foram revertidos na economia local, e que no mesmo período a indústria de fibras precisou importar da Índia cerca de R$ 120 milhões. “Esse dinheiro da importação poderia ser totalmente investido no Amazonas, garantindo mais emprego e melhorando a renda dos agricultores ribeirinhos do interior, pois mercado para fibra existe”, ressaltou Petrucio.

O gerente da CTC-Manacapuru, Elandio Pantoja, explica que o pagamento da subvenção se dá referente à nota fiscal emitida em nome do produtor. Para todo o produtor que produz uma quantidade de fibra, juta e malva é emitida uma nota fiscal, que credencia o produtor ao pagamento da subvenção. “Só nós geramos uma média de 1.500 empregos diretos no interior e aproximadamente 100 a 150 famílias na cidade. Fora outras atividades que giram em torno do nosso setor, como pontões, barcos, mão de obra e outros setores que se beneficiam do nosso setor”, pontuou Pantoja, ressaltando que a fábrica, também atua no fornecimento de sementes aos produtores e também garante aos produtores a compra da juta e da malva nas épocas de colheita.

“Com isso, vai alavancar a situação do produtor se animar para produzir cada vez mais. Com a fibra dessa semente, a gente faz o fio que vai beneficiar a sacaria para uso de café, batata e demais outros itens no mercado nacional. Então, a produção de fibra hoje vem dar um incentivo muito grande a classe produtora”, completou o gerente da CTC.

A presidente da Cooperativa Coomapem, Eliana Medeiro, enfatiza que a cultura da juta e malva é uma atividade produtiva e importante para a economia da Amazônia, condicionada ao ciclo das águas que fertilizam a várzea onde as matérias-primas são cultivadas. Atualmente, quando vendido diretamente na indústria, o valor do quilo da malva é de R$ 3,10 e da juta R$ 3,15. E, quando recolhida na propriedade, a malva é vendida a R$ 2,80 e a juta R$ 2,90.

Subvenção econômica de R$ 0,50 é concedida pelo Governo do Amazonas como incentivo aos produtores pelo quilo da fibra

A nova geração de fibras

Curauá, planta da família do abacaxi

Uma nova fibra, a “Curauá” (Ananas erectifolius), produzida com sucesso em Santarém, Oeste do Pará, já está sendo testada em solo amazonense. Segundo o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), Juan Revilla, doutor em Ciências Biológicas, a planta amazônica da família do abacaxi, a Curauá, depois de processada, é usada na indústria de colchões, calçados e principalmente no acabamento interno de automóveis.

Ainda de acordo com Juan, o produto também está sendo introduzido no setor têxtil, na fabricação de tecido em composição com o plástico injetável, em substituição a fibra de vidro. Juan informou que o Curauá também está sendo introduzido no setor têxtil, na fabricação de tecido em composição com sede e viscos e o de plástico injetável em substituição à fibra de vidro.

Experimento com a Munguba

Com a capacidade de germinação em torno de 95%, a Munguba (Pseudobombax munguba), é também uma alternativa para a confecção de bonecos, travesseiros, almofadas e colchões, além de seu fruto ser incorporado na alimentação por meio da produção de paçoca e de outros alimentos.

Uma das vantagens dessa fibra é que em menos de cinco anos ela chega a produzir cerca de 200 frutos em cada árvore, em área de várzea. Segundo o pesquisador do Inpa, Juan Revilla, que também é especialista em Inventário Florístico em Fitomassa pelo Instituto Max Plank da Alemanha, o mesmo estudo vem sendo desenvolvido com o Curauá. Durante os testes de viabilidade econômica, foi possível coletar mais de 12 mil frutos e obter cerca de 300 quilos de fibra.

Samaúma, a árvore-mãe da floresta 

A Samaúma (Ceiba pentandra), além de ser conhecida na mitologia indígena como a “árvore da vida” ou “escada do céu”, também é admirada pela fibra obtida de seus frutos. Essa árvore imponente, de raízes e enormes e tabulares chamadas de sapopemas, produz uma fibra muito fina e sedosa, bastante usada em vestuários, principalmente em blusas e casacos, pois seu material não permite a entrada de calor e frio. “Ela deixa uma temperatura muito agradável no corpo”, diz Juan Revilla.

O pesquisador destaca que, no continente africano, a fibra do fruto da sumaúma é bastante utilizada na confecção de roupas. No Amazonas, esse trabalho está em fase de pesquisa. A espécie poderá ser trabalhada no futuro para gerar renda e fortificar a economia no Amazonas.

Risco à saúde dos juteiros e malveiros

No processo de plantio, após a colheita, que é feita quando o rio começa a subir, inicia-se uma fase extremamente árdua e arriscada. É preciso deixar as hastes de juta e malva de molho por um período de 15 dias para que amoleçam. Esse processo é conhecido como “maceração”. Só depois elas podem ser descortiçadas/desfibradas com as mãos.

Desse modo, o produtor precisa ficar muitas horas dentro do rio, sujeitando-se ao ataque de arraias, jacarés, cobras e outras animais, e vulnerável a doenças como hepatite, reumatismo e resfriados. Também é possível aparecerem problemas de visão devido à radiação do sol refletida pela água em direção aos olhos do produtor.

Apesar das dificuldades que os produtores de juta/malva enfrentam, a insalubridade a que estão expostos não impede a produção. Consciente dos riscos, eles afirmam que os maiores problemas são os valores comercializados pelas fibras e pelo transporte para o escoamento da produção, fatores que se encontram estreitamente ligados e que são a marca das relações sociais de produção arraigadas na região amazônica.

 

*A reportagem é dedica aos juticultores e malveiros que há décadas atuam na cultura de fibras nos beiradões da Amazônia Brasileira 


 

 

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Rodrigo Rivera